
A partir do golpe militar de 1964 e em parceria com Gianfrancesco Guarnieri, Boal inaugurou a linha nacionalista do Arena com Eles Não Usam Black-tie. Lançou Arena Conta Zumbi e mais tarde Arena Conta Tiradentes.
Em 1971, depois de preso e torturado pelo regime militar, Boal foi exilado e passou a desenvolver experiências teatrais em diversos países, onde obteve reconhecimento do público, da crítica, de estudiosos e do meio teatral.
Até a sua morte, em 2009, Augusto Boal viveu no Rio de Janeiro e dirigiu o CTO - Centro de Teatro do Oprimido. Sua peça O Homem Que Era Uma Fábrica foi montada no Brasil pela primeira vez pela Cia Arthur Arnaldo
Abaixo, uma entrevista feita com o grande dramaturgo, assinada por Ana Paula Cassettari da equipe de O Palco.
OPalco – O que despertou seu interesse por teatro? Como ingressou na carreira de autor e diretor teatral?
No meu livro, HAMLET E O FILHO DO PADEIRO, uma autobiografia, eu explico isso direitinho. Ou melhor, explico que isso não é racionalmente explicável. Muitas pessoas tiveram infâncias parecidas com a minha e nem todas se entusiasmaram pelo teatro. Talvez o fato de ficar sentado na ponte na frente da minha casa, olhando as pessoas passarem, tenha me influenciado a ver o que há de teatro na vida e de vida no teatro.
OPalco – O que é e como atua o CTO – Centro de Teatro do Oprimido?
Nossos Curingas ajudam grupos sociais (empregadas domésticas, comunidades, usuários de um hospital psiquiátrico, grupos temáticos, etc.) e desenvolverem aquilo que seus componentes já possuem dentro de si mesmos porque são seres humanos: a capacidade de expressarem teatralmente suas idéias e suas emoções com o corpo, a voz, o movimento, etc. Ajudam-nos a usarem o teatro como forma de estudarem a realidade e prepararem a sua transformação.
OPalco – O senhor costuma dizer que o teatro é um meio de transformação subjetiva. O que isso significa?
Shakespeare disse em Hamlet que o teatro é um espelho onde podemos ver nossos vícios e nossas virtudes: para mim, é um espelho mágico onde podemos penetrar e transformar a nossa imagem em outra melhor. Como sabemos, o ato de transformar é transformador: não é preciso ser poeta para se escrever um poema mas quem escreve um poema se torna um poeta. A transformação deve ser subjetiva e objetiva.
OPalco – O que é o Teatro Invisível? Como o senhor o concebeu?
É uma cena que se representa em qualquer lugar sem que se advirta a platéia de que se trata de uma cena ensaiada: o espectador pode se tornar ator e o ator torna-se espectador do espectador-ator. Ficção e realidade se interpenetram. No meu livro JOGOS PARA ATORES E NÃO ATORES há dezenas de exemplos disso.
OPalco – O senhor foi preso devido a censura durante o regime militar. Ainda existe algum tipo de censura ao trabalho do artista no Brasil?
Fui preso pela horrenda ditadura cívico militar que roubou o Brasil dos Brasileiros. Antes, existia a censura da polícia, agora existe a da sedução: se fizermos aquilo que os financiadores desejam, teremos todos os recursos necessários., Se quisermos fazer o que desejamos nós, nenhum. Hoje já não existe mais a figura do Diretor Artístico: quem escolhe o que vai ou não ser montado, quem escolhe o elenco, tudo, são as empresas através da famigerada lei Rouanet.
OPalco – Como o senhor avalia o panorama do teatro brasileiro nos dias de hoje?
Ninguém pode responder. O teatro brasileiro não é só o eixo do sudeste, mas temos o norte, o nordeste, o sul, o centro-oeste: quem conhece isso tudo? Ninguém.
OPalco – O senhor estudou dramaturgia nos EUA. Qual é a importância de sua formação para o caráter de seu trabalho no teatro? O que o senhor aprendeu de mais significativo com os gringos?
A minha maior formação foi olhar o povo nas ruas, as pessoas no trabalho, no lazer, ouvir sonhos e metas, pensar. Na escola a gente aprende certas técnicas. Aprendi.
OPalco – Na peça “O Homem Que Era Uma Fábrica”, escrita em 1972 e em cartaz pela primeira vez no Brasil, o senhor critica o desejo dos latino-americanos em fazer a vida nos EUA. É um tema muito atual. Acredita que algo mudou desde então? A Era Bush abalou o “sonho americano” de se viver num país livre?
Em primeiro lugar, os US são uma ditadura disfarçada. Só quem tem bilhões de dólares (as grandes corporações) pode concorrer à presidência da República. Isso é democracia??? Claro que não. Os US são uma Plutocracia: manda quem tem dinheiro. Mas existe ainda gente desesperada buscando emprego, que quer e precisa de emprego seja até no inferno. E lá vão eles em busca de um paraíso que não existe, ou melhor, existe sim, mas só para os ricos.
Augusto Boal morreu em maio de 2009 devido a uma insuficiencia respiratória. O teatrólogo sofria de leucemia e estava internado desde abril do mesmo ano.
Fonte: http://www.opalco.com.br/foco.cfm?persona=materias&controle=123
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,morre-augusto-boal-o-criador-do-teatro-do-oprimido,364445,0.htm
Por Anderson Moura
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